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FOTO: Associação Agostinho da Silva |
Artigo publicado no jornal “A Batalha” nº 247 -Novembro/Dezembro de 2011
A obra escrita de Agostinho da
Silva, logo pelo volume da sua produção, espalhando-se por milhares e milhares
de páginas, logo pela singularidade da sua criação, mostrando um escritor de
talento rijo que fabricou sem esforço os seus modelos próprios, afastando-se
dos caminhos já trilhados, é um daqueles legados que a todos os títulos se
poder ter como excepcional, um daqueles raros picos que ajudam a humanidade
inteira a saltar etapas evolutivas e a alcançar novos e mais adiantados
horizontes.
A extensa actividade de Agostinho
da Silva, distribuída por cerca de sete décadas, estendendo-se por quase todo o
século XX, com uma vasta acção pedagógica em prol da elevação cultural dos seus
compatriotas e a criação de novas e mais dinâmicas metas sociais, apresenta no
miolo da sua substância afinidade forte e fecunda com as ideias libertárias, às
quais de resto em vários momentos e de modos variados prestou atenção e rendeu preito.
Numa entrevista de 1986, quando a
jornalista do Diário de Lisboa, Lurdes Féria, lhe perguntou se fora alguma vez
marxista, respondeu que tive a sorte de não ser ista nenhum e o importante não
é ser marxista mas ser Marx, para de imediato, interrogado se era libertário,
respondeu pode ser, na mesma época em, conversa com Henryk Siewierski, seu
interlocutor polaco, hoje na Universidade de Brasília, afirmou uma utopia de
paz, de liberdade, quase que diríamos assim: uma utopia anarquista (...) no
sentido de não haver opressão de nenhuma espécie.
Ao lado destas e de outras
alusões, Agostinho da Silva deixou muitos e muitos textos em que sem referir de
forma directa as ideias libertárias, e sem correlação aparente com elas, delas
se aproxima ou com elas se funde, quer pelo envolver do pensar, quer pela
afinidade espontânea das visões, como por exemplo sucede no texto de 1943, A
Doutrina Cristã, superior ao que antes dele se escrevera no género entre nós,
de Antero a António Sérgio, e que levou alguns estudiosos recentes do seu
pensamento, como Amon Pinho e Romana Valente Pinho, a considerarem estarmos
diante dum pensador que, para ser cingido em toda a sua complexidade, deve
[ser] entendido no seio do anarquismo cristão.
Agostinho da Silva, o autor
português mais traduzido para Esperanto, cerca de quarenta obras, viveu ainda
uma vida de homem livre, mal conhecida por agora em muitos do seus ricos
pormenores, uma vida que ensaiou libertar-se das várias algemas que o coagiam e
que surge toda ela como um exemplo de acção directa em prol da libertação
humana e dos ideias libertários, antes de mais, numa das mais surpreendentes
atitudes que lhe conhecemos, na obstinada recusa, que levou exemplarmente até
ao fim, de receber direitos de autor sobre aquilo que publicava, considerando
que nada lhe pertencia e o que o tinha a todos pertencia.
É o legado extraordinário deste
homem que o presente número de A Batalha decide recordar, republicando o texto
de 1943 acima citado, e apresentando do seu autor uma resenha biográfica e uma
cronologia, que se destinam apenas a estimular nos leitores a curiosidade e o
interesse pela sua obra. A Associação Agostinho da Silva - que se agradece na
pessoa de Rui Lopo o apoio dado neste trabalho - procura hoje recolher,
conservar e divulgar este rico património espiritual. Para os interessados aqui
se deixam os contactos: www.agostinhodasilva.pt e agostinhodasilva@mail.pt.
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